segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Indústria Musical vs. Internet Livre

É sim um assunto delicado. Diversos desdobramentos, pontos de vista e coerência de ambos os lados envolvidos. Na verdade o que paira é um embate que ainda levará tempo para se definir, sem que seja possível prever de que lado a corda vai estourar. Sempre estoura do lado do mais fraco, certo? Mas qual lado é o mais fraco?

Algo que sempre precisa ser lembrado, pois às vezes parece que é esquecido, música é arte. E como arte, o objetivo de ela existir, do artista criá-la é qual? Não estou dizendo que não seja justo o artista viver da sua arte, ganhando dinheiro com ela, muito pelo contrário. Além do que, ganhar dinheiro com arte não é uma invenção moderna. Só que não havendo antigamente o recurso da gravação, a profissão era mais direta, do artista para o público.

Com o advento da gravação surgiu depois de muito tempo a famigerada indústria da música que, até antes da popularização da internet, era uma e depois começou a sofrer grandes impactos. As grandes gravadoras, chamadas de majors, detinham todo o negócio nas mãos. Um artista não se fazia por si só, sem uma grande gravadora empresariando, divulgando e contando as cifras. O jabá parecia de certa forma ser bem aceito e pouco falado, muito menos assumido. Assim foi fácil ter os modismos que existiram antigamente que não davam brecha para o muito mais além do que as gravadoras quisessem manter foco.

Falando assim parece até que defendo que as majors são a sucursal do inferno, né? Não é bem assim... Falarei mais adiante sobre isso.

Antes preciso comentar da revolução promovida pela internet e novas tecnologias. Pare e pense bem como eram as coisas antes de você começar a usar a internet. Como fazia para você ouvir as músicas que gostava, descobrir novas músicas e artistas e comprar música. Percebe? A primeira coisa é que antes, praticamente a música chegava até o público, na maioria das vezes enfiada goela abaixo, e hoje o público corre atrás. Os meios de divulgação restritos permitiam as gravadoras controlar melhor o consumo e com a internet livre, cada um ouve o que quer, quando quer e como quer. Os artistas também ganharam um canal amplo de divulgação de seus trabalhos e, somado às tecnologias de gravação que também se tornaram mais simples e acessíveis, foi promovida uma verdadeira quebra de paradigmas. E com isso a atuação da indústria da música mudou, certamente, muito a contra gosto.

Elas não ganham tanto com a massificação, já que não têm mais esse controle. Ganham mais com alguns poucos arqtistas fixos, financeiramente viáeis, novos lançamentos e explorando pequenos nichos. E na outra mão, hoje é muito fácil ser imdependente. Até a divulgação do trabalho se torna eficaz pela internet e, mesmo sendo inegável o poder que as gravadoras ainda têm, elas tomaram algumas rasteiras. O golpe foi duplo pois, as novas tecnologias promoveram a alforria dos artistas e também impactou as vendas, pois nunca foi tão fácil piratear música.

Aqui entramos na questão do que é pirataria, que também abordarei depois.

Queria só fazer uma parte aqui de algo que eu vejo acontecer há um bom tempo e acho curioso. Está mudando, claro, a percepção é nítida. Hoje, principalmente graças à popularização do Twitter. Estou falando da interação dos artistas com a internet e novas tecnologias. Eu pergunto, desde quando ser artista significou ser retrógrado e antiquado? Não havia um tempo que ser artista era ser de vanguarda? Não era ser associado com algo moderno, instigante, revolucionário? Quase sempre associado à subversão, à quebra de paradigmas como a internet promoveu? Então... Me soa muito estranho que por muito tempo tantos artistas, e muitos ainda hoje, estejam fora da rede. Seja para utilização com questões profissionais como para questões pessoais. Muitos parecem ter verdadeira fobia e associam até a uma imagem meio pejorativa. Parafraseando Marcelo Tas no programa da Fernanda Young no GNT: A internet não é uma rede de computadores, mas sim uma rede de pessoas. A internet e essas novas tecnologias representam hoje a inovação com a qual os artistas deviam estar comungando. Se assim fosse talvez até as questões pendentes desta discussão hoje em dia já estivessem mais encaminhadas.

A conclusão desse pensamento é a chave de tudo ao meu ver.

Alinhavando melhor o meu ponto de vista, tenho o seguinte a dizer. O direito autoral sempre proibiu a cópia de músicas sem autorização. Mesmo quando a cópia era em fitas K7. O que mudou foi o impacto no bolso das pessoas. É caro gravar, mixar, masterizar, prensar e distribuir um álbum. Do início ao fim do processo inúmeros profissionais da música, fotografia e artes plásticas são acionados para ter um CD numa loja, sem contar todas as questões comerciais e de logística. As gravadoras têm que pagar todo mundo e ainda ter lucro com um produto que, ali na esquina, tem um quase igual, muito mais barato, com uma menor qualidade no que diz respeito à apresentação sim, mas na questão sonora em si é idêntico. Não adianta inventarem que produto pirata necessariamente estraga o aparelho de som, te deixa surdo e te faz ficar brocha. É mentira. Sempre achei ridículo as pessoas pregando isso, alguns até meio que inocentemente, diante da sua fobia de tecnologia. A questão dos piratas é que a ilegalidade do produto não permite um controle de qualidade muito sofisticado, mas tenham certeza que a grande maioria do público que comprou ficou satisfeito com o seu produto "alternativo".

O direito autoral não é só um direito constituído por lei. É um direito ético que deve ser respeitado e realmente a primeira frente nociva que prejudica os músicos e todos os operários da música é a pirataria que vende um produto sem autorização. Aí é de cara uma quebra de ética, e não só da lei, a venda e aquisição de produtos dessa natureza, com um impacto direto. Afinal estão ganhando dinheiro em cima da arte de outras pessoas que ficam a ver navios sem esse retorno. E aí não importa como chega ao público. Se num CD que o cara compra na esquina, ou se ele baixa de um site, de forma gratuita, mas que o dono do site faz dinheiro com propagandas. Esse é o primeiro nível de pirataria, que deve ser combatido de imediato.

No entanto a controvérsia que está surgindo com este assunto é porque ele sempre cai na liberdade da internet e na troca de músicas sem fins lucrativos. Aí a questão tem muitas nuances e opiniões diferentes para se qualificar o que pode e o que não pode. Nunca ninguém ficou muito estressado com a troca de músicas entre amigos, principalmente antes da digitalização da música. E mesmo agora, tem gente que ache ser uma boa forma de divulgação, outros não aceitam de jeito nenhum. A lei diz que sem permissão do artista não pode, mas esbarra, com a internet, em problemas de jurisdição, pois a música pode estar lá num servidor na rússia para download, e também problemas de dificuldade de ficalização. Legal e eticamente falando, a autorização seria primordial.

A perda de dinheiro de um lado complica na outra ponta. Todo mundo diz que o preço do produto precisa ser mais barato, mas como? Se as vendas não estão bem, há menos dinheiro. Com muitos artistas livres das gravadoras, usando-as somente para distribuição, há menos dinheiro. A forma seria reduzir custos. Com pessoal, arte gráfica e a tendência seria o produto ficar mais próximo do pirata. Um dos argumentos dos amantes do vinil é que com o CD se perdeu muito em arte gráfica, mas não foi só uma questão de espaço físico. Eu já comprei CDs com encartes muito ricos, mas cada vez mais eles vão ficando mais simples, a concorrência é muito cruel. E como reduzir ainda mais os custos se, em crise, as gravadoras já tenham feito o possível?

É aí que não vejo as majors como vilãs e ponto final. A indústria tem seu lado ruim porque ela tem que mudar, as grandes gravadoras têm que parar de remar contra a correnteza e encontrar um meio de aproveitá-la, revendo não somente sua esperança em recuperar a margem de lucro, mas alternativas novas de negócio. A venda de música está mudando e todos ficam muito presos e enraizados em certas formas obsoletas como se simplesmente isso não pudesse ser mudado. Precisa existir o CD vendido como hoje, por exemplo? Não estou defendendo uma direção específica, estou defendendo a discussão. O raciocínio a respeito em busca de boas idéias. A indústria tem focado em combater algo controverso que é a troca de músicas entre pessoas sem fim lucrativos, ao invés de lutar para combater a pirataria explícita. Enquanto as autoridades não forem devidamente cobradas, ainda continuará a ter policiais parando na banquinha para comprar CD pirata, por exemplo. Não tenho os dados estatísticos, mas levando em conta a situação socio-econômica do povo brasileiro eu me pergunto: o prejuízo é maior com o que, a troca de arquivos por usuários de internet, ou a venda de CDs e sites não autorizados com fins lucrativos.

Os artistas também são prejudicados pela redução das vendas. Acabam voltando a depender muito dos shows, o que pode inclusive encarecer seus cachês levando a se exigir mais dinheiro do público para assistí-lo. E mesmo sofrendo não só pela quebra do direito autoral, mas também pela redução do retorno financeiro, não se vê uma união dos artistas em função disso. A verdade é que a chave de tudo está nas mãos deles. Músicos, cantores e compositores, unindo-se em massa, expressivamente, conseguiriam discutir e chegar nos moldes que primariam pelos direitos autorais e financeiros, assim como sem deixar de lado a arte em si. E conseguiriam impor ao mercado, ao legislativo e ao público quais seriam as regras.

O que acontece, na verdade, tristemente é que você tem muito boas opiniões isoladas, mas todos estão que alguém resolva a questão por eles. Reclama-se das gravadoras, das autoridades, do ECAD, da Ordem do Músicos, mas são estas instituições que vêm regendo as regras e lutando por interesses que, sim, nem sempre são os interesses dos artistas efetivamente, mas em fim, os artistas estão vendo a banda, a internet, a pirataria passar e ficam sentados só constatando o que já é fato, ao invés de ter uma atitude pro-ativa para o futuro. Uma andorinha só não faz verão, mas se todos se unissem verdadeiramente, e a internet possibilitaria isso em nível nacional inclusive, dificilmente as autoridades, gravadoras e opinião pública deixariam de ouvir. Os artistas fazem a música, ou seja, os artistas deveriam tomar as rédeas e decidir o seu interesse. Propondo mudanças, fazendo cobranças. Com o histórico que o Brasil tem, na época da ditadura e tal, era de se esperar outra postura.

Como disse, isso se arrastará por muito ainda. E quem vencerá a queda de braço? Só o tempo vai dizer...